Das dificuldades em arranjar um emprego e passar por entrevistas constrangedoras à contratação como jovem aprendiz do IDESQ. É assim que a jovem trans Joana Lopes tem comemorado a recente oportunidade que, para ela, significa muito. Em abril, Joana iniciou no programa Jovem Aprendiz IDESQ, como auxiliar de escritório no ISGH (Instituto de Saúde e Gestão Hospitalar), que é nossa parceira.
A empresa respeitou o nome social da jovem e, no crachá que a identifica como funcionária, está escrito Joana Lopes. “É o meu nome de verdade, o nome que eu escolhi para mim, que respeita o meu gênero. A pessoa falar que vai respeitar meu nome no trabalho e que o meu crachá vai ter o meu nome é muito gratificante e feliz”, afirma.
Neste 17 de maio, Dia Internacional contra a LGBTfobia, o IDESQ entrevista a jovem, como uma forma de ressaltar a importância da inclusão da comunidade LGBTQI+ no mercado de trabalho e como uma forma de incentivar às empresas a aceitarem a diversidade no quadro de colaboradores, como tem feito o ISGH.
Para a Superintendente de Desenvolvimento Humano do ISGH, Lea Pereira, as corporações precisam incentivar essa cultura. “Considero que uma das maiores qualidades universal é a diversidade. Essa pluralidade traz benefícios para todos, além de contribuir para a evolução da sociedade, possibilitando a aceitação de quem sofre com o preconceito. As organizações são peças-chave para o início de uma cultura mais inclusiva, onde essa deve ser demonstrada em seu quadro de pessoal”, afirma.
O Brasil é o país que mais mata transexuais no mundo, de acordo com o último relatório divulgado em janeiro de 2021, pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (Antra). Os dados também revelam que o Ceará é o segundo estado do país no número de mortes, perdendo apenas para São Paulo. Ao todo, o país teve 175 assassinatos, sendo 80 em SP e 62 no Ceará. A Bahia é o terceiro estado com mais mortes, contabilizando 59 pessoas trans assassinadas.
De acordo com o gestor administrativo do IDESQ, Eudázio Nobre, os jovens, em geral, enfrentam duas dificuldades, quando o assunto é mercado de trabalho: a falta de qualificação e falta de experiência.
“A juventude negra, LGBTQI+ e da periferia enfrenta ainda maiores obstáculos para a inserção no mercado de trabalho. Isso é real e é uma das frentes de trabalho do IDESQ, para fortalecer o jovem, para se preparar para essas dificuldades extras. Também temos feito um trabalho junto às empresas, conscientizando da importância de oportunizar esses jovens nas vagas das suas corporações. Temos duas empresas parceiras que possuem um olhar bem amplo para essas questões, uma é o ISGH e a outra é a Casas Freitas”, comenta.
O maior sonho de Joana é justamente viver em um país que respeite a diversidade, que não existam assassinatos de pessoas trans. “Apesar dos pesares eu gosto do Brasil. Eu ainda acredito de verdade nisso e espero que a gente ainda vá chegar nesse nível. Quero viver bem e ter uma vida digna e, quando eu falo de ter uma vida digna, é o básico do básico: ter um emprego e poder sair e entrar dos lugares sendo respeitada pelo meu nome, pela minha identidade, pelo que eu sou.”, afirma.
A realidade da jovem, no entendo, é outra. “Quando uma pessoa se descobre trans vivendo no país que vive, a pessoa tem medo de viver, de sair na rua com a roupa que quer, da forma que quer, expressando o que quer, usando batom, usando maquiagem… Mas eu entendi que é sobre aceitar e ser quem você é mesmo, independente de morar no pais que mais mata pessoas trans no mundo”.
Quando deixou o Ensino Médio, aos 18 anos, Joana participou de diversos cursos, para conseguir um emprego. Mas ela logo percebeu a dificuldade que era ser aceita no mercado de trabalho.
“O que eu não esperava é que você pode ter um currículo cheio de cursos e ser capacitada para muitas coisas, mas só o fato de você ser trans, já vai ter um empecilho para não entrar em tal empresa, em tal trabalho. Quando foi apresentada essa realidade para mim, o meu mundo caiu. Fiquei desesperada, porque eu poderia ter muitos cursos, mas eu teria que mostrar muito mais do que eu tenho”, lamenta Joana, comentando que pessoas cisgêneras (aquelas que possuem anatomia, sexo e biologia de acordo com o gênero ao qual se identifica) não precisam passar pelas mesmas condições que as pessoas trans.
Até hoje Joana afirma ter “trauma de entrevistas de emprego”, porque eram um momentos constrangedores, com as pessoas questionando sobre não ter ainda os documentos retificados, com o nome social. “Já sofri muito, as pessoas sendo invasivas e até agressivas com minha identidade”.
Antes do IDESQ, a única experiência de trabalho válida que Joana relata foi na Rede Cuca, quando era bolsista e atuava com protagonismo juvenil, fazendo formações, palestras, eventos, para a sociedade LGBTQI+, focando mais na comunidade trans.
Atualmente, Joana comenta que já não se afeta com o preconceito, apesar de já ter sofrido muito em anos anteriores. “Eu já passei por tanta transfobia que tal hora você cria uma casca, uma armadura. Tal hora você já está acostumada com aquilo. É triste isso, mas a gente se torna forte. No meio dessa jornada toda, a gente perde amigos, a gente perde familiares e não é nem para a morte, é por simplesmente deixar de lado coisas que te fazem mal e começar a ser você mesmo”, comenta a aprendiz, afirmando ainda que mantém por perto pessoas que a amam do jeito que ela é.
5 Comments
Que esse relato sirva de incentivo para as empresas se tornarem mais inclusivas e a criarem mais espaços seguros para essas pessoas. E que jovens trans se sintam mais confiantes ao se inserirem no mercado de trabalho na busca por suas autonomias e a dignidade que lhes é de direito! Em tempos sombrios, isso dá esperança. Que haja mais Joanas por esse Brasil!
Maravilhosa demais!!!!!!!
Pessoas trans, podem chegar e ocupar esse espaço que é nosso.Obrigada pela matéria
Não nada mais belo do que humanos respeitando e amando… humanos.
Fico muito feliz por esta conquista
Isso é um forte sinal de que a nossa espécie mostra sinais de evolução.
Parabéns!
Muito orgulho dessa Mulher! É lamentável que pessoas precisem enfrentar preconceuto por ser quem é. Também acredito em um Brasil melhor Joana e assim caminhamos.