“A educação liberta e salva. Posso dizer isso, porque sou uma mulher negra, que mora em um lugar periférico, que estudou em escola pública. Já perdi vários amigos para o crime… o que me salvou e me libertou foi a educação”, afirma a jovem aprendiz do IDESQ, Andreza Freire. Assim como diversos educandos da instituição, ela também participou das atividades realizadas pelo IDESQ no mês da Consciência Negra, em novembro.
Aprendiz desde agosto deste ano e trabalhando na rede Carrefour, Andreza comenta que só a educação pode mudar o rumo da vida das pessoas. “Podem ver um mundo melhor, um futuro melhor, respeito, igualdade social. Não se consegue combater o racismo sem a educação. É muito importante ter professores e professoras negras que coloquem pra frente essas temáticas”, ressalta, comentando ainda que discutir os temas é relevante “para informar e conscientizar os alunos”.
“No mundo que a gente vive, ser negro ou negra requer muita coragem. É fato que as pessoas brancas também precisam aprender sobre a história, aprender o motivo de certos acontecimentos e quais são os papéis delas”, afirma Andreza.
Você sabe o que é branquitude?
Nome dado à construção social da identidade racial branca a partir da noção de que é superior as demais, sendo considerada erroneamente como um “padrão”. Quando uma pessoa se classifica racialmente como branca, há características da identidade que são reproduzidas pela sociedade, como algo positivo. Na prática, as noções que envolvem a identidade branca (sinônimo de civilização, educação, beleza, inteligência, capacidade) são valorizadas quando se copara às noções das identidades não-branca. Ou seja, ao longo da construção social, ser branco já é considerado um lugar de vantagem, repleto de privilégios.
O IDESQ realizou uma série de atividades, no mês da Consciência Negra, para debater diversos temas, como racismo estrutural e institucional, políticas públicas par a juventude negra e saúde coletiva. Mais de 150 jovens aprendizes participaram do momento.
De acordo com o professor do IDESQ, Anderson Varella, que foi um dos organizadores das palestras, o objetivo da ação foi buscar discutir diversas problemáticas que estão “diretamente ligadas aos jovens que são atendidos pela instituição do IDESQ. Jovens advindos do contexto de zonas periféricas, rurais, em vulnerabilidade social”. Anderson afirma ainda que os debates foram discutidos de forma a interligar aos temas de mercado de trabalho.
“Debatemos sobre a necessidade de políticas públicas e a questão da profissionalização da juventude negra no pós-pandemia. Como a gente sabe, vários programas e políticas públicas já foram canceladas e muitos jovens entram nesses dados estatísticos do desemprego. A segunda palestra foi sobre racismo e saúde da população negra. Discutimos a própria questão da violência do estado para com a população negra. A última palestra foi abordando o racismo estrutural e institucional. Nós realizamos alguns diálogos. Primeiramente, o que é racismo estrutural? O que é racismo institucional? Em seguida discutimos dados estatísticos à aplicabilidade real desses conceitos teóricos, para que os estudantes, além de terem essa formação profissional para serem inseridos no mercado de trabalho, eles entendam todas essas problemáticas por trás de fatos históricos, sociais que, querendo ou não, influenciam diretamente nessa constituição do mercado de trabalho, nos lugares sociais em que são impostos em meio a esse contexto”, explica o professor.
Para combater o racismo, segundo ele, é importante falar sobre a reestruturação dos currículos educacionais. “Eles são influenciados diretamente sobre esse processo de colonização e escravismo, onde atualmente nós temos currículos, no âmbito educacional, que podem ser considerados como currículos eurocêntricos. Vão privilegiar esse saber e essas teorias advindas da Europa, do colonizador, essa questão do vencedor sobre os vencidos. Essas discussões específicas sobre população negra, sobre África, sobre cultura afro descendente é ignorada dentro desse contexto educacional atual”, afirma.
Por isso, a importância da Lei 10.639/03 que tem como objetivo descolonizar os currículos, segundo Anderson.
“Amparando-se nessa lei, que é uma das principais referências para mim, temos algumas orientações de como discutir, como agir. Buscar e almejar uma sociedade mais justa, levando em consideração todas essas desigualdades, que a gente sabe que, historicamente, foram impostas para a população negra. Como nós podemos agir de forma positiva dentro desse contexto? Justamente fazendo eventos, como esse no mês de novembro – não somente no mês de novembro, mas o mês de novembro dá essa oportunidade maior – para discutir sobre população negra e desigualdade racial… A gente pode discutir esses conteúdos de forma transversal e isso se aplica a várias e várias outras disciplinas”.
De acordo com o professor Anderson Varella, este é um termo conceituado pelo estudioso, filósofo e advogado Silvio Almeida.
“Quando a gente fala em uma sociedade pautada e fundada no racismo estrutural, estamos falando de uma sociedade que tem resquícios do período escravista, onde essas posições e esses lugares sociais foram sendo determinados nesse período histórico e até então prevalecem. São relações desiguais no mercado de trabalho, no âmbito educacional, na saúde…”, comenta o professor Anderson, com base no conceito de Silvio Almeida.
Para o professor, as pessoas negras terem mais dificuldades em se inserir no mercado de trabalho formal ou pouco acesso à educação, com evasão escolar, comprovam o racismo estrutural. “A sociedade, como um toda, foi estruturada e formada a partir dessa perspectiva do racismo estrutural e isso influencia, diretamente, dentro das instituições”.